sexta-feira, 30 de julho de 2010

Porões da noite



Porque aquela mulher não se calava nunca, porque se queixava sempre, porque para ela não havia uma bobagem que não fosse um problema, porque estava farto de trabalhar feito burro de carga e ainda por cima aguentar a sua parentela, porque na cama tinha que rogar como um mendigo, porque ela andou com outro e se fazia de santa, porque ela doía nele como nunca ninguém havia doído e porque sem ela não conseguia viver mas com ela também não, ele se viu obrigado a torcer-lhe o cangote, como se fosse uma galinha.
Porque esse homem não escutava nunca, porque nunca ligava para ela, porque para ele não havia um problema que não fosse uma bobagem, porque estava farta de trabalhar feito mula e ainda por cima aguentar aquele patife e toda a sua parentela, porque na cama tinha que obedecer como uma puta, porque ele andou com outra e contava a todo mundo, porque ele doía nela como jamais ninguém havia doido e porque sem ele não conseguia viver mas com ele também não, ela se viu obrigada a empurrá-lo do décimo andar, como se fosse um pacote.
No final daquela noite, tomaram juntos o café da manhã. Como todos os dias, a rádio transmitia música e notícias. Nenhuma notícia chamou a sua atenção. Os notíciários não cuidam de sonhos.

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